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Número 81

Mídia Gravada

Humberto Santilli
humbertosantilli@uol.com.br

 

A Ilusão do Palco Sonoro     

               O palco sonoro, como o ouvimos em nossos sistemas de som estéreo, principalmente em gravações audiófilas e orgânicas, nos parece tão real como se pudéssemos dizer exatamente onde cada instrumentista está localizado e em que ambiente sonoro eles estão.
               Mas o que o consumidor final não sabe é que este palco sonoro, tão real, é construído artificialmente. O cérebro humano identifica auditivamente o tamanho de uma sala, suas superfícies e a posição da fonte sonora nesta sala, baseado em três fatores variáveis, que são: a freqüência, a amplitude e a fase.

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               O mais significativo destes fatores é a fase, que nada mais é do que a diferença de tempo em que um som chega a cada um dos nossos ouvidos, levando-se em conta um ouvido em relação ao outro. Considerando os três fatores, por exemplo, um som que chega aos nossos dois ouvidos na mesma fase, amplitude e freqüência é interpretado pelo nosso cérebro como um som que vem do centro. Se houver diferença em algum destes elementos, nosso ouvido interpretará que há alguma diferença nas superfícies da sala ou na posição da fonte sonora. Se somarmos a isso as reflexões da sala, a diferença de tempo em que cada ouvido capta o mesmo som e conteúdo tonal de cada reflexão, teremos a percepção do tamanho da sala e da distância da fonte sonora.
              As técnicas de microfonação mais comuns, para se “emular” (simular) a audição binaural humana, são as microfonações estéreo, que são capazes de captar boa parte das diferenças entre um “ouvido” (microfone) e outro. Mas mesmo essas técnicas não são suficientes para recriar, em um sistema estéreo, toda a espacialidade percebida em uma execução ao vivo. Além disso, as microfonações estéreo não são regra nas captações em estúdio ou locação. Na maioria das vezes, o material gravado é captado mono por instrumento, ou a gravação é feita com alguns microfones captando o mesmo instrumento em posições assimétricas, não estéreo, com o intuito de captar diferentes timbres do instrumento e mesclá-los na mixagem.

              Assim, o palco sonoro, tão realista, que ouvimos, em uma reprodução estéreo, vem do uso de delays, equalizadores, volumes da mesa de som, inversores de polaridade e do pan das mesas (panorama), que altera a quantidade de volume enviada a cada canal, causando a percepção de lateralidade (reprodução além das caixas acústicas à direta e à esquerda).
              Um exemplo primoroso do uso destes efeitos, principalmente para recriar as diferenças de fase e “enganar” nossos ouvidos, é o cd Heart Of The Forest (
A Lateralidade do Palco Sonoro ), que tem sons que surgem atrás do ouvinte, principalmente em ambientes tratados, como o do Laboratório de Acústica e Áudio da By Knirsch, que é uma sala de audição crítica (elaborada conforme a norma IEC 60.268-13). Neste disco há um efeito em especial em que um garoto "surge" atrás e à direita do ouvinte, muito além do palco sonoro comum de um sistema estéreo. Este efeito pode ser recriado a partir da duplicação de um áudio mono, subseqüente abertura de um destes áudios à esquerda do pan e outro à direita e, por fim, a inversão de polaridade de um destes áudios. Esta técnica e muitas outras criadas em estúdio são responsáveis por “enganar” nossos ouvidos, com as sensações de lateralidade, espacialidade, profundidade, etc. em mixagens estéreo. Lembrando que essa espacialidade criada em uma mixagem só será plenamente percebida em um sistema estéreo se o tempo de reverberação da sala de audição onde o ouvinte está não for muito alto. Lembrem disso em suas audições!
Boas audições a todos!

 
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